Por Eduardo Alves

Na sua intervenção durante a celebração do Primeiro de Maio da UGT o antigo detentor da pasta do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Vieira da Silva, afirma também não ser altura de discutir a lei do teletrabalho, lembrando que nas sociedades modernas deve ser feito um debate ponderado e abrangente sobre a importância da negociação colectiva.

Referindo que debater contratação é um debate de ideias, e na sua essência, um debate político, Vieira da Silva considera que se devia olhar para a negociação colectiva como força produtiva, como factor para o desenvolvimento económico e social da sociedade, sendo, desta forma, possível observar um potencial indiscutível de aumento da produtividade na economia.

Por outro lado, também neste conceito de força produtiva, afirma, a negociação colectiva é um estabilizador de incertezas e nesse ponto de vista dá garantias de continuidade dos ciclos económicos e de negócios que nenhum outro instrumento consegue proporcionar, agindo, por conseguinte, como um factor de redução de riscos.

Um sector económico coberto por um quadro negocial estabilizado afasta desde logo um conjunto de factores de risco que põe em causa o normal funcionamento das organizações e que prejudicam uma reflexão estratégica. Mais do que nunca, reforça o antigo governante, fazer economia hoje implica capacidade de ter reflexão estratégica face à incerteza que vivemos em sociedade.

Outro pilar na negociação colectiva que encontra é funcionar como um estabilizador social, promovendo uma diminuição de riscos de fractura nas sociedades.

Sobre os ciclos económicos e a negociação colectiva, quando a cobertura desta é hoje ¼ da que existia em 2008, refere não encontrar margem para grandes alterações ao quadro legal da negociação colectiva, no entanto, acredita poder haver algo mais a fazer quanto ao reforço dos instrumentos de arbitragem, que não são muito apoiados ou valorizados.

A percepção que as partes têm da importância da negociação colectiva é algo que precisa ser confrontado com a realidade, considera Vieira da Silva, incluindo não só as organizações e sindicatos, mas também os demais stakeholders. Pela importância de que se reveste, nunca deveria ser delegada pelas organizações em consultores especializados, afirma.

Desafia as estruturas sindicais a edificar a capacidade de recuperar a adesão que está longe da que os trabalhadores sindicalizados merecem e necessitam, a par da necessidade de promover o consenso social acerca da importância de negociar e de produzir resultados, que entende ser algo frágil, quando comparado com outros países da Europa.

Pela fragmentação que existe na União Europeia, no sistema político, a existência de forças políticas disruptivas que se têm mostrado anti negociais no que diz respeito à legislação laboral, mas também porque em alguns aspectos a diferenças de óptica entre o modelo social e o papel da negociação atravessam as próprias organizações, o quadro europeu é um quadro de incerteza, diz, com o exemplo da discussão em curso sobre o salário mínimo na Europa, em que existem diferenças entre as visões dos vários países, forças políticas e parceiros sociais, sendo que para mitigar esta incerteza é necessário valorizar as áreas onde se projecta a possibilidade de melhoria das condições políticas que favoreçam a negociação.

Lamentando que os debates mais recentes tenham ocorrido mais no plano macropolítico do que em sede de negociação colectiva, nos quais reconhece ter havido alguma produção positiva, antevê que a organização do tempo de trabalho irá sofrer mais pressões de mudança e se não for na negociação colectiva que essa regulação é feita, será através de mecanismos informais, com a consequente perda de influência de mecanismos negociais. Será uma inevitabilidade, porque será essa a pressão colocada sobre o mercado de trabalho.

Mostrando-se céptico acerca da “excitação legislativa” que marca toda esta situação da pandemia, defende categoricamente que o teletrabalho tem de ser discutido na negociação colectiva, considerando que o teletrabalho na pandemia não tem nada a ver com as relações laborais no período pós pandémico, não sendo, por isso, altura de discutir a Lei que regula o teletrabalho.

Como desafios para o futuro, Vieira da Silva exorta os diversos actores da negociação colectiva a comprometerem-se com as novas exigências sociais. Igualdade, igualdade de género, diferenças salariais entre homens e mulheres, questões de assédio precisam de ser melhor trabalhadas neste âmbito, para que esta ferramenta sirva, efectivamente, para a finalidade com que se construiu, a harmonização social.